segunda-feira, 9 de agosto de 2010

Diga adeus, Romeu.



Gritos vindos do meu sótão. Que inferno! Será que isso não terá fim jamais? Logo eu, que sempre vivi na escuridão silenciosa e sufocante, agora estava cercada de vozes que imploravam meu perdão. Imploravam por ajuda. Eu até poderia poupar-lhe a vida, mas eu quero, eu preciso de um minuto de paz, e enquanto ele continuar respirando, eu nunca terei. Alguém nesta casa irá morrer esta noite, e ainda não é minha hora.
“Socorro, socorro! Alguém me ajude!”. Como ele era patético. Eu não entendi como aquele miserável ainda tinha forças para gritar tão alto, pois ele estava trancafiado ali havia três dias, sem comida ou bebida. Só ele e seus machucados. Pensei que ele morreria rápido, mas é mais forte do que pensei, o que é até bom, pois agora ele pode provar do próprio veneno, pode ter a chance de sofrer tanto quanto eu sofri quando ele me abandonou na escuridão.
A sala estava fria, e o sofá antigo já não era tão confortável. Minhas costas doíam e minhas pernas latejavam. O pêndulo no canto da sala soou, informando-me que já era meia-noite. A hora tão esperada. Levantei-me do sofá com esforço e segui caminhando lentamente para a cozinha. Abri a única gaveta inteira naquele armário caindo aos pedaços, mas não havia nenhum talher ali, e sim uma pistola. Uma glock 17, calibre 9mm para ser exata. Meu pai era militar, isso talvez explique minha paixão por armas de fogo. Mas naquela pistola só havia uma bala, que já tinha destino certo.
Subi lentamente a escada, e a cada degrau que eu subia, os gritos iam se silenciando calmamente, enquanto a madeira rangia cada vez mais alto.
John, meu irmão mais novo, estava de vigia na porta. Ele me abraçou e senti seus lábios tocarem minha bochecha. Senti seu corpo definido apertando o meu, quando foi que ele tinha crescido tanto assim? Eu podia sentir a tensão no seu abraço.
– Tudo bem John, tudo acabará esta noite e amanhã será uma nova vida. – sussurrei ao seu ouvido. Ele apenas afirmou com a cabeça, destrancou a porta e me deu passagem. Entrei naquele lugar escuro e logo pude localizar seus olhos. Azuis. Lembrei-me de quando mergulhei naquela imensidão azul sem saber o que me aguardava. Seus olhos faiscavam em minha direção, e eu não entendi o significado disso. Encostei a porta, sem tirar os olhos dele. Pude ouvir John descendo a escada.
– Olá querido – ele estava tremendo. E ele estava chorando. – Não tenha medo, meu amor. Será muito rápido e todo esse sofrimento irá passar. – Acho que eu falava isso mais tentando convencer a mim mesma, do que a ele.
Apontei a arma em sua direção, mas algo me deteve. Aqueles olhos avançavam para mim. Sua respiração, eu já podia sentir, estava forte e quente. Vi seus olhos se fechando, e os meus também, instintivamente. Um segundo depois, nossas almas estavam sendo trocadas mais uma vez, e o fogo nos consumia. Mas a dor ainda dominava meu peito, e o desespero de que toda a dor acabasse de uma vez, falou mais alto. Encostei o cano em seu peito, enquanto nossos lábios se consumiam no fogo e no gelo. Um disparo, o tiro certeiro. Ele estava caído aos meus pés, para sempre. O melhor beijo da minha vida. E então eu pude estar mais uma vez com meu melhor amigo: o silêncio.

Nenhum comentário:

Postar um comentário